sábado, 28 de março de 2009
Dos calhaus em si mesmos ou Como descer uma serra e sair de lá inteiro
Sobe, sobe, sobe, sobe.
Desce, sobe, sobe, sobe. E continua a subir até os teus pulmões e pernas começarem a dar de si.
Agora atira-te para o chão e tenta não desfalecer sobre o sol abrasador das onze da manhã da Primavera lusa.
Sim, porque lá no topo não há árvores. Só mar e arbustos pelo peito e calhaus literalmente ao pontapé. E o mar chama. Mas o mar é a um mergulho de mais de 300 metros, de silvado e mato raso, e calcário vingativo. Não vale a pena tentar.
Mais caminho e mais coisas verdes a entranharem-se pela roupa adentro e a esconder os caminhos (louvado seja o inventor da bela da calça de ganga!). E, quase sem se dar conta, embora os nossos pés o notem, está-se no topo. No píncaro de lá do sitio. E o que se vê? Mais mar, desta feita a mais de 350 metros de queda, de um lado o caminho subido aos tropeções, e do outro o que terá de ser descido, à base de trambolhão.
Agora começa a descida. Agora sem tanto mato rasteiro a atrapalhar, mas com paredes de rochas com inclinações para cima dos 45º (para os iletrados basta dizer que estava demasiado próximo da vertical). Ora, adaptando-se às condições e indo buscar ideias à bem dita natureza, é mais fácil descer à moda do caranguejo e descer a coisa a quatro patas, de rabo a arrastar-se pelo chão.
Passadas as "escarpas", começa o verdadeiro teste. A inclinação da montanha mantém-se, só que desta a descida é feita, no sentido literal do corta-mato. Com mais silvado e roseiras bravas a impedirem os caminhos que seriam mais fáceis, há que pegar em paus e começar à pseudo-catanada em tudo aquilo que nos apareça à frente e que seja aparentado com plantas (não vale a pena tentar assassinar os colegas que nos acompanham, pois podem ser úteis em caso de apara-quedas).
Enfim, o agradável chão calcetado do topo da serrania agora só faz saudades. Caminha-se sobre camadas de folhas caídas e primas de lianas que crescem no chão e pregam rasteiras aos mais incautos. E se agradeça quando estão no chão, porque quando se lembram de trepar e continuam a não se fazer notar, parecem ter um apetite voraz em se prender aos pescoços dos caminhantes.
Escorregando pelas folhas, temendo-se um derrocada, já que aquilo era tudo menos chão, e uma manada ao passar faz sempre estragos, é agradável chegar a terrenos menos inclinados.
Aí, por baixo de pinheiros e eucaliptos, sabe bem um almoço e uma paragem. Há quem tenha tempo até para limar unhas...
De barriga aconchegada e de bexiga mais leve (para quem pode e tem material útil neste tipo de situações ao ar livre - como quem diz para os rapazes), inicia-se novo caminho. Caminho aberto a custo, em tudo semelhante à descida de antes, mas desta feita, os arbustos dão lugar a mais silvas e rosas bravas. Picos e arranhões são excelentes recordações.
E eis se não que, depois de descer, por mato cerrado e coisas verdes inomináveis, por entre o arvoredo começam a nascer indícios de erva fresca. Dessa que se diz crescer em campos e pastos.
E a felicidade se apodera do caminhante, pois a descida terminou e [agora pára a música do Jurassic Park e começa a cena inicial da Música no Coração] só se vêem pastos lisos...
E vacas com olhares amigáveis.
Ou como alguém exclamou : "Bitoques, olhem tantos bitoques ali à frente!"
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